Construindo com Sustentabilidade

Por André Delacerda

j2 A onda verde avançou durante as duas últimas décadas e hoje se faz uma realidade em muitos segmentos sociais,  e vertentes econômicas. A importância de se adotar práticas sustentáveis, incluiu governos, empresas e também a sociedade como um todo.

No momento em que o planeta passa por fortes transformações econômicas, sociais e também naturais, o mundo volta seus olhos para a sustentabilidade. E não seria diferente no que tange a busca pela moradia que siga padrões de ecoefiência tanto para o morador, quanto para o seu entorno. Assim, o Eco Briefing´s buscando melhor informar o leitor, traz uma entrevista que aborda a temática de como se dar a integração entre a arquitetura e a sustentabilidade. A entrevista foi feita com a arquiteta, urbanista e bióloga Martha Nader, que é uma das idealizadoras do Ecohabitar, e que compartilha conosco importantes informações sobre com construir com ecoeficiência.

Eco Briefing´s – Martha, você é formada em arquitetura e urbanismo, e também em biologia. Como surgifoto para currículo-1u seu interesse pela sustentabilidade e o meio ambiente?

Martha Nader – Desde os tempos de colégio havia a dúvida quanto à carreira a seguir. Quando passei no vestibular para a Faculdade de Arquitetura na USP, as minhas dúvidas se aplacaram por um tempo, mas ao cursar cadeiras como Planejamento Urbano, Projeto e Paisagismo, eu sentia, já na década de 80, que faltava um cunho ecológico e uma cadeira específica nesse sentido. Na época, ainda vivíamos o final da ditadura militar, e, para além dos aspetos mais técnicos do curso, a questão do momento era a do binômio “forma X função” na arquitetura. Assim foi a busca de uma componente mais ambientalista que me levou a cursar Biologia no período noturno, também na Universidade de São Paulo. Já nessa época havia preocupações com desmatamentos, e foi na própria década de 80 que me mudei para a Granja Viana, bairro de Cotia com características próprias e considerado “verde” ou “alternativo”.

O curso de Biologia, porém, era ainda mais restrito quanto ao foco, os professores eram ultra-especializados e lá havia ainda menos espaço para qualquer abordagem interdisciplinar. Assim, o que acabou ocorrendo foi quase uma inevitabilidade: sendo uma arquiteta que cursou biologia, e que mora no cinturão verde da Grande São Paulo, região aonde os resquícios de mata atlântica fazem parte da Reserva da Biosfera, protegida pela UNESCO, a aeco2bordagem à profissão tinha que ser essa.

Eco Briefing´s – O movimento ecológico tem ganhado grandes proporções em todo mundo, influenciando vários setores, como este se integra à arquitetura?

Martha Nader – Arquitetura é uma intervenção no espaço físico, na natureza. Daí que qualquer construção implique, em maior ou menor grau, uma agressão no meio-ambiente. O que o movimento ecológico tem feito é lançar luz e revitalizar práticas que na verdade são muito antigas e comuns a todos os lugares do planeta: construir de acordo com o ambiente, incorporando aos projetos os elementos naturais (luz solar, ventilação, materiais) de modo a que estes trabalhem com o arquiteto. O que sucedeu muito nas últimas décadas com o progresso tecnológico e com a “overdose” de crédito disponível foi o inverso: o arquiteto não fez caso do entorno e impôs os seus (caros) projetos ao ambiente. j

Eco Briefing´s – O que é construir com sustentabilidade?

Martha Nader – Construir com sustentabilidade é ter presente que os recursos naturais não são inesgotáveis e que não podemos impedir as próximas gerações de também os usufruir. Portanto, mais do que tentar obter o selo “A” ou “B” na sua construção, o importante é ter noção do problema e levá-lo em consideração quando se projeta e constrói, na escolha dos equipamentos e materiais. Não existe uma fórmula fechada para “construção sustentável”.

Eco Briefing´s – Como surgiu a idéia de monta a Ecohabitar?

Martha Nader – Moro e trabalho na Granja Viana que é um bairro de Cotia que pelas suas características naturais incorporou a harmonia com a natureza ao seu estilo de vida. A região fica pertinho de uma das maiores reservas integrantes do Cinturão Verde de São Paulo, o Morro Grande, exemplo perfeito da Mata Atlântica. Isso, e o fato de ser arquiteta e bióloga, fez com que a opção por uma abordagem sustentável da atividade fosse quase uma decorrência natural. Assim nasceu a Ecohabitar.

Eco Briefing´s – Estivemos visitando o site de vocês e vi que vocês desenvolvem os projetos baseados em cinco princípios. Quais são e como isto funciona na prática nas construções?

Martha Nader – Os cinco princípios para uma arquitetura sustentável são: Design Inteligente, Materiais Ecológicos, Eficiência Energética, Uso Racional de Água e Preservação Ambiental. O Design Inteligente é a base e o início de tudo. Um bom projeto adequado ao terreno, ao regime de ventos e à exposição solar do lugar é determinante no futuro desempenho sustentável da construção. A escolha dos materiais deve também ser feita de modo consciente, não só do modo como são produzidos e utilizados, mas também atendendo a critérios como durabilidade, manutenção e quantidade de resíduos decorrentes da sua aplicação. A Eficiência Energética e o Uso Racional da Água são igualmente dois princípios fundamentais para quem constrói pensando na utilização do imóvel no longo prazo e não apenas nos custos da obra. Inúmeras projeções das mais diversas fontes nos alertam para um inevitável aumento de preços de energia e água num futuro próximo. Aliás, tem idéia de quanto o custo desses serviços aumentou nos últimos cinco anos? A preocupação quanto à Preservação Ambiental hoje em dia já é, felizmente, decorrente de lei. Para além da obrigatoriedade legal da preservação de entorno vegetal (ou compensação pelo seu abate) a utilização de tintas não poluentes e de outros materiais “amigos do ambiente” é também uma prioridade. m_medium

Eco Briefing´s – Quais as vantagens para o morador em morar em uma “casa ecológica?”.casaecologicas

Martha Nader – Para além daquelas que todo o mundo conhece,  que são a contribuição para que o planeta fique mais saudável, existem vantagens econômicas evidentes e verificáveis nas contas mensais. Uma casa ecológica economiza energia e água encanada durante toda a sua vida útil e a economia gerada pode ser contabilizada facilmente com um exemplo simples: atente-se na quantidade de água encanada usada por uma descarga comum e pense-se na sua substituição por água armazenada da chuva. Multiplique-se pela quantidade de vezes que ela é acionada ao longo da vida útil de uma casa. Viu só, quanta economia?

Eco Briefing´s – Falando do material de construção.Gostaríamos de saber como se dar o aperfeiçoamento do correto uso dos materiais? As fibras naturais são empregadas nas construções?

Martha Nader – O principal problema ligado à utilização dos materiais de construção é a quantidade de resíduos produzida. Um grande passo no aperfeiçoamento do correto uso dos materiais é eliminar esse desperdício que causa enormes danos ao meio ambiente e às finanças de quem constrói. Outro fator a ter em conta, mas também ligado a este, é a durabilidade e as exigências de manutenção dos materiais utilizados em obra: quanto mais duráveis e menos manutenção tiverem, melhor para o binômio cliente/ambiente.

Quanto aos materiais altero_mediumnativos, como as fibras naturais ou os resultantes de reciclagem, têm surgido ultimamente soluções muito interessantes, como, por exemplo, as que utilizam o bambu, material barato e de excelente resistência e flexibilidade. O problema está ainda na dificuldade que os produtores encontram na sua distribuição, já que o cidadão comum precisa ainda garimpar muito se os quiser utilizar em sua obra.

Eco Briefing´s – As energias renováveis já são uma realidade hoje nas construções brasileiras?

Martha Nader – Se falarmos de aquecimento de água com energia solar, com certeza! Existem hoje no Brasil dezenas de fabricantes que vendem kits prontos a preços muito acessíveis. Por todo o país, inúmeros programas de habitação popular de âmbito municipal, estadual e federal exigem a adoção dessa tecnologia em seus projetos. Outro tipo de energias, como a eólica ou a utilização de painéis fotovoltaicos, não dispõem ainda de tecnologia que as torne economicamente acessíveis para a grande maioria dos utilizadores individuais daí que o seu uso seja ainda restrito a usos mais institucionais.

Eco Briefing´s – Muita gente imagina que morar em uma casa ecoeficiente deva ser caro. É alto o custo para desenvolver um projeto deste porte? Como o cidadão que às vezes não possui grandes recursos pode integrar a ecoeficiência em caecohabitar10sa?

Comecemos pelo fim: o custo de desenvolver um projeto ecoeficiente é exatamente o mesmo de desenvolver qualquer outro projeto, ou seja, o acréscimo a pagar para ter um projeto ecoeficiente é zero. O cidadão que não tem grandes recursos, que não consiga, por exemplo, pagar um sistema de aquecimento solar (e eles estão ficando bem baratos) pode recorrer à criatividade brasileira e construir um com materiais comuns (existem exemplos de como fazê-lo no youtube). Para, além disso, se ao construir conseguir aproveitar ao máximo o perfil natural do terreno, seguir a orientação solar para maximizar a iluminação natural e adequar o projeto ao regime de ventos estará já integrando ecoeficiência em sua casa gratuitamente, porque irá economizar materiais e recursos na obra e energia na utilização diária da casa. Quanto ao custo de morar em casa ecoeficiente, a realidade é exatamente a oposta: é mais barato! Esse é um dos paradigmas que nós lutamos para mudar: a noção de “custo” de uma casa. Numa época em que o crédito à habitação atinge em cada vez maior número de casos valores de 100% do preço de venda, em vez de relacionar “custo” com esse preço, achamos que o verdadeiro “custo” de uma casa é o total de despesas mensais com que teremos que lidar enquanto nela vivermos. Aqui estão incluídos os valores da prestação do financiamento, impostos, seguros e condomínio mas também os custos de água, eletricidade e outros que serão reduzidos com a opção por uma casa ecoeficiente.

Eco Briefing´s – Como o público tem aceito a idéia de construir com sustentabilidade? O brasileiro ecohabitar20gosta dessa idéia?

Martha Nader – O brasileiro gosta da idéia de construir com sustentabilidade, mas muita gente ainda possui uma imagem algo distorcida do conceito, associando-o ora a uma imagem quase hippie, ora a algo hipertecnológico e, portanto, caro. Felizmente, com a exposição que o tema tem tido na imprensa, essa impressão tende a mudar e notamos muita curiosidade e interesse de nossos clientes sobre o assunto.

Eco Briefing´s – Fica aberto espaco para suas considerações finais.

Martha Nader – A abordagem sustentável na arquitetura não se trata de uma questão de mais caro ou mais barato, nem mesmo de partido arquitetônico ou sistema de construção. É muito mais uma questão de atitude e posicionamento. Para além do respeito ao meio-ambiente contempla também o respeito a si próprio e ao seu bolso. Vejo, portanto, como extremamente positivo o momento atual, no sentido que todo o setor de construção expressa preocupações com o ambiente e a sustentabilidade.

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Fotos: Ecohabitar

8 Respostas para “Construindo com Sustentabilidade

  1. Pedro Paulo Oliveira

    Olá Martha.
    Parabéns pela matéria.
    Fico aguardando asiosamente pela viabilização da energia fotovoltaica, além da solar e porque não da eólica ou geotérmica.
    Grande abraço.
    Pedro.

  2. Olá Pedro

    Que bom que você gostou! Nós da Ecohabitar ficamos orgulhosos de contar com o apoio de gente comprometida como o André e a equipe do Eco Briefing´s.
    Um grande abraço!
    Martha

  3. Meus parabéns Matha.
    Otima entrevista, bola pra frente, queremos ver a EcoHabitar cada vez mais no alto.
    Beijos
    Fábio/Aida

  4. Que legal ver vocês por aqui!
    Beijos aos dois, Martha

  5. Puxa Marta, que entrevista legal. Vou recomendar aos meus alunos darem uma olhadinha…

    Beijos,

    Zysman

  6. Obrigada, Zysman!! Se eu puder fornecer mais alguma informação aos seus alunos, é só perguntar!!

  7. Olá, pessoal do blog. Sou a Clarissa e trabalho na Edelman, agência de comunicação do site ComoTudoFunciona. Muito bacana a entrevista e a desmistificação das construções sustentáveis. Ela pode estar ao alcance de todos.
    Este link explica mais sobre este tipo de construção e seus benefícios – http://ambiente.hsw.uol.com.br/casa-sustentavel.htm
    Abraços

  8. Martha,

    Eu trabalho com aquecedores solares e acho que falta um incentivo para a popularização do sistema,acredito que a vontade politica ainda é pouca,mas o setor tem um futuro promissor,é o caminho natural da evolução.

    Tambem trabalho com a venda de materiais de demolição e acredito que esse setor tambem tem um lugar na sustentabilidade,pois recicla objetos e materiais,eu gosto muito da ideia de saber que uma coisa que iria para o lixo pode ser reutilizada e ainda produzir trabalhos extraordinariamente belos,cito o exemplo dos tijolos de demolição.

    Um grande abraço.

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